Tentando pensar e viver como um Reformado: Reflexões de um estrangeiro residente – Parte 59

Paulo diz que “Toda Escritura é inspirada por Deus e útil para (…) a educação (paidei/a) na justiça” (2Tm 3.16).

A palavra paidei/a (de onde vem a nossa “pedagogia”),[1] significa “educação das crianças”, e tem o sentido de treinamento, instrução, disciplina, ensino, exercício, castigo.

Cada cultura tem o seu modelo de homem ideal e, portanto, a educação visa formar esse homem, a fim de atender às expectativas sociais. Paulo sabia muito bem disso; ele mesmo declarara durante a sua defesa em Jerusalém que fora instruído por Gamaliel, o grande mestre da Lei. “Eu sou judeu, nasci em Tarso da Cilícia, mas criei-me nesta cidade e aqui fui instruído (paideu/w) aos pés de Gamaliel, segundo a exatidão da lei de nossos antepassados” (At 22.3).

De igual modo, Estevão, descrevendo a vida de Moisés, fala de sua formação, declarando: “E Moisés foi educado (paideu/w) em toda a ciência dos egípcios, e era poderoso em palavras e obras” (At 7.22).

Cito um fato elucidativo. Quando Virgínia e Maryland assinaram um tratado de paz com os Índios das Seis Nações, como demonstração da generosidade do homem branco, seus governantes mandaram cartas aos índios solicitando que enviassem alguns de seus jovens para estudarem em seus colégios. Seguem abaixo extratos da resposta dos chefes indígenas:

….Nós estamos convencidos, portanto, que os senhores desejam o bem para nós e agradecemos de todo o coração.

Mas aqueles que são sábios reconhecem que diferentes nações têm concepções diferentes das coisas e, sendo assim, os senhores não ficarão ofendidos ao saber que a vossa ideia de educação não é a mesma que a nossa.

…. Muitos dos nossos bravos guerreiros foram formados nas escolas do Norte e aprenderam toda a vossa ciência. Mas, quando eles voltavam para nós, eles eram maus corredores, ignorantes da vida da floresta e incapazes de suportarem o frio e a fome. Não sabiam como caçar o veado, matar o inimigo e construir uma cabana, e falavam nossa língua muito mal. Eles eram, portanto, totalmente inúteis. Não serviam como guerreiros, como caçadores ou como conselheiros.

Ficamos extremamente agradecidos pela vossa oferta e, embora não possamos aceitá-la, para mostrar a nossa gratidão oferecemos aos nobres senhores de Virgínia que nos enviem alguns dos seus jovens, que lhes ensinaremos tudo o que sabemos e faremos, deles, homens.[2]

Se olharmos ainda que de relance o tipo de formação desde a Antiguidade, poderemos constatar que o seu ideal variava de povo para povo e, até mesmo, de cidade para cidade, daí a diferença entre os “currículos“, visto que este é o caminho, a “corrida” para se atingir o objetivo proposto. Assim, temos, ainda que, grosso modo, diversas perspectivas educacionais[3] ***que estão associadas a diversos pressupostos explícitos ou não.

  • CHINA: A educação visava conservar intactas as tradições. Portanto, o currículo está voltado apenas para o conhecimento e preservação das tradições, seguindo sempre o seu modelo. A originalidade era proibida.
  • EGITO: Preparar o educando para uma vida essencialmente prática, que o levasse ao sucesso neste mundo e, por intermédio de determinados ritos, alcançasse o favor dos deuses, e a felicidade no além.
  • HOMERO: “O educador da Grécia”, como o denomina Platão,[4] tinha como meta formar homens virtuosos inspirando-se nos heróis em seus atos de bravura na consecução de seus ideais.[5]
  • ESPARTA: Homens guerreiros, mas que fossem totalmente submissos ao Estado. Neste processo estimula-se até mesmo à delação como modo de evidenciar a sua lealdade ao Estado.[6]

Marrou (1904-1977) comenta:

Certamente, essa Esparta dos séculos VIII-VI é, antes de tudo, um Estado guerreiro (…). O lugar dominante ocupado em sua cultura pelo ideal militar é atestado pelas elegias guerreiras de Tirteu, que ilustram belas obras plásticas contemporâneas, consagradas, como elas, à glorificação do herói combatente.[7]

Ao atingir sete anos, o jovem espartano é requisitado pelo Estado: até à morte, pertence-lhe inteiramente. A educação propriamente dita vai dos sete aos vinte anos; ela é disposta sob a autoridade direta de um magistrado especial, verdadeiro comissário da Educação nacional, o paidono/moj.[8]

  • ATENAS: Treinamento competitivo entre os homens a fim de formar cidadãos maduros física e espiritualmente com capacidade de exercitarem a sua liberdade.
  • SÓCRATES (469-399 a.C.)/PLATÃO (427-347 a.C.): Formar basicamente por meio da música e da ginástica, homens capazes de vencer a injustiça reinante.[9] A educação tinha um forte apelo moral por intermédio do conhecimento e prática das virtudes. A sabedoria está associada à vida virtuosa.[10]
  • OS SOFISTAS:[11] Pedagogia elitizada,[12] propícia e adequada apenas a quem pudesse pagá-los,[13] leia-se: “jovens ricos”,[14] especialmente na Gramática, na Literatura, na Filosofia, na Religião e, principalmente na Retórica. Esses jovens, por sua vez, estavam ávidos por construir suas carreiras na vida pública, onde a oratória era, sem dúvida, indispensável.[15]

Bréhier (1876-1952) resume:

A sofística, que caracteriza os últimos cinquenta anos do século V, não designa uma doutrina, mas uma maneira de ensinar. Os sofistas são professores que vão de cidade em cidade em busca de auditores e que, por preço convencionado, ensinam os alunos, seja por lições pomposas, seja por uma série de cursos, os métodos adequados a fazer triunfar uma tese qualquer. À pesquisa e à manifestação da verdade substitui-se a preocupação do êxito, baseado na arte de convencer, de persuadir, de seduzir.[16]

Partindo do relativismo e subjetivismo,[17] tinha como objetivo convencer,[18] persuadir o seu oponente independentemente da veracidade do argumento.[19]  No entanto, vale a pena levar em consideração a observação não solitária de Kenny: “A busca da verdade histórica sobre os sofistas não é mais recompensadora do que a tentativa de descobrir como eram o rei Lear ou o príncipe Hamlet antes de Shakespeare deles se apropriar”.[20]

  • ARISTÓTELES (384-322 a.C.): Formar homens moderados, que tivessem zelo pela ética e estética.[21]
  • ROMANOS: Educação eminentemente prática, preparando o indivíduo para servir ao Estado.
  • RENASCENÇA: Formar homens eruditos que soubessem ler e escrever em grego, latim e, em alguns lugares, também o hebraico,[22] tendo um estilo refinado, que pudessem contribuir para a criação do novo, tendo o homem como “medida de todas as coisas”.

Retornando ao ensino bíblico, perguntamos: E nós, que tipo de homens somos?. Que tipo de formação temos dado aos nossos filhos? Que tipo de formação a Igreja tem proporcionado à infância e à juventude? Que modelo temos apresentado? Notemos, que Paulo nos diz: “Toda Escritura é inspirada por Deus e útil para o ensino (didaskali/a), para a repreensão, para a correção, para a educação (paidei/a) na justiça” (2Tm 3.16).

É neste sentido que Salomão diz: “O temor do Senhor é o princípio do saber, mas os loucos desprezam a sabedoria e o ensino (LXX: paidei/a) (Pv 1.7; Vd. Pv. 9.10; 15.33; Sl 111.10). “Ouvi o ensino (LXX: paidei/a), sêde sábios, e não o rejeites” (Pv 8.33).

A educação significa também “disciplina”. Deus muitas vezes usa este recurso para nos educar, a fim de que sejamos salvos. Paulo diz: “Mas, quando julgados, somos disciplinados (paideu/w) pelo Senhor, para não sermos condenados com o mundo” (1Co 11.32).

Na educação divina (disciplina), vemos estampada a sua graça, não necessariamente a sua ira,[23] que atua de forma pedagógica: “Porquanto a graça de Deus se manifestou salvadora a todos os homens, educando-nos (paideu/w) para que, renegadas a impiedade e as paixões mundanas, vivamos no presente século, sensata, justa e piedosamente” (Tt 2.11-12) –; e o seu amor.

Jesus disse: “Eu repreendo (e)le/gxw) e disciplino (paideu/w) a quantos amo. Sê, pois, zeloso, e arrepende-te” (Ap 3.19). Aqui, como em outros textos, percebemos a ligação entre a repreensão e a disciplina (= educação) operada por Deus naqueles a quem Ele ama.

Moisés, compreendendo bem a “didática” de Deus, diz ao povo:

Recordar-te-ás de todo o caminho, pelo qual o Senhor teu Deus te guiou no deserto estes quarenta anos, para te humilhar (hfnf(),[24] para te provar, para saber o que estava no teu coração (לבב) (lebab), se guardarias ou não os seus mandamentos. Ele te humilhou (hfnf(), e te deixou ter fome, e te sustentou com o maná, que tu não conheceste, nem teus pais o conheceram, para te dar a entender que não só de pão viverá o homem, mas de tudo o que procede da boca do Senhor, disso viverá o homem. (Dt 8.2-3. Do mesmo modo, Dt 8.16) (Vejam-se: Sl 102.23; Is 64.12; Lm 3.33).

O salmista narra a sua experiência: “Foi-me bom ter eu passado pela aflição (hfnf(), para que aprendesse (למד)(lâmad) os teus decretos” (Sl 119.71). As aflições corretamente compreendidas podem ser instrumentos utilíssimos para a prevenção e correção de nossos desvios espirituais.

O que a Palavra de Deus nos mostra, e por certo temos confirmado isto em nossa experiência, é que buscamos a Deus mais intensamente em meios às aflições: “Estou aflitíssimo (hfnf(), vivifica-me, Senhor, segundo a tua palavra” (Sl 119.107). “Antes de ser afligido (hfnf(), andava errado, mas agora guardo a tua palavra” (Sl 119.67).

O coração contrito – demonstra Moisés – aprende com a disciplina do Senhor e se alegra por Deus tê-lo afligido: “Alegra-nos por tantos dias quantos nos tens afligido (hfnf(), por tantos anos quantos suportamos a adversidade” (Sl 90.15).

O desejo de Deus é a restauração de seus filhos. Neste sentido, Paulo recomenda ao jovem Timóteo como deveria agir com aqueles que se opunham à mensagem do Evangelho:

Disciplinando (paideu/w = “ensinando”, “instruindo”) com mansidão os que se opõem, na expectativa de que Deus lhes conceda não só o arrependimento para conhecerem plenamente a verdade, mas também o retorno à sensatez, livrando-se eles dos laços do diabo, tendo sido feitos cativos por ele, para cumprirem a sua vontade. (2Tm 2.25-26).

Morton faz um quadro comparativo relevante, mostrando porque os grandes sistemas educacionais da Antiguidade fracassaram, enquanto o de Israel não:

Pode-se dizer que o sistema de Esparta apontou para a destruição do indivíduo no serviço ao estado. Pode-se dizer que o sistema de Atenas apontou para treinar  o indivíduo no serviço da cultura. Em Roma, o treinamento do indivíduo foi no serviço do estado. O objetivo de Israel foi treinar o indivíduo no serviço de Deus. O objetivo em Roma, Esparta e Atenas malogrou em um nível moral. O sistema deles não continha a fé capaz de desafiar indiferença e superficialidade. Portanto, eles perderam  senso de direção e falharam. (…) A educação judaica nunca perdeu seu senso de direção. A sua intenção não era educação em conhecimento acadêmico e técnico, mas educação em santidade (Lv 19.2). Apesar do povo de Israel frequentemente esquecer os ideais, sempre houve sacerdotes, profetas, escribas, sábios, rabinos e professores para relembrá-los. Deus era o centro e não homem; retidão era o alvo e não o interesse próprio (Ex 19.6).[25]

Sendo assim, todo currículo está comprometido, consciente ou não, com determinada compreensão da realidade que, deste modo, determina metas a serem alcançadas.

Para nós cristãos, é impossível a consideração de absolutos em nosso currículo. Sem o absoluto ficamos a vagar sendo conduzidos por tendências, estatísticas, consenso, “histórias de sucesso”, etc.

A educação começa com Deus e nos conduz de volta a Ele por meio da utilização de todos os recursos que Ele nos concede, quer pela graça especial, quer pela graça comum. No entanto, a sociedade está em constante mudança. Aqui não há espaço para uma retórica saudosista idealizada por uma lembrança sempre seletiva; nem para uma utopia social idealizada a partir de baixo. Portanto, temos que trabalhar firmados em absolutos (Partindo de cima )e entender o nosso tempo, rogando a Deus que nos dê discernimento na aplicação desses absolutos onde vivemos, como meio de formação, correção e transformação da sociedade.

Rushdoony (1916-2001) faz uma resumo adequado: “O currículo sadio é o currículo relevante, e relevância exige dois fatores: um mundo de absolutos e um mundo mutável. Não é suficiente sustentar os absolutos divinos: eles devem estar contínua e novamente relacionados à mudança dos tempos.”[26]

O grande objetivo dos reformadores era preparar homens e mulheres, que, obedientes a Deus, o servissem por intermédio do aperfeiçoamento e emprego de suas habilidades, procurando em todas as esferas da sua existência glorificar a Deus, realizando assim o propósito de sua criação.

Por isso, dentro da visão Reformada-Puritana, “O currículo incluía tanto a teologia como as artes e ciências, tanto a Bíblia como os clássicos”, sumaria Ryken.[27]

 

Rev. Hermisten Maia Pereira da Costa

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[1] paidagwgi/a.

[2]Apud Carlos R. Brandão, O Que é Educação, 6. ed., São Paulo: Brasiliense, 1982, p. 8-9.

[3]Veja-se um bom sumário disso em Thomas Ransom Giles, Filosofia da Educação, São Paulo: EPU., 1983, p. 60-92.

[4] Platão, A República, 7. ed. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, (1993), 606e, p. 475. Num fragmento de Xenófanes de Colofão (c. 570-c.460 a.C.), crítico ferrenho de Homero, encontramos a menção: “Desde o início todos aprenderam seguindo Homero” (Xenófanes, Fragmento 10: In: José Cavalcante de Souza, org.6 Os Pré-Socráticos, São Paulo: Abril Cultural (Os Pensadores, v. 1), 1973, p. 70).

[5] A palavra traduzida, ainda que inadequadamente, por virtude (a)reth/) relaciona-se àquilo que faz com que uma coisa seja o que é. Sobre o conceito de virtude (a)reth/) entre os gregos, vejam-se: O. Bauernfeind, a)reth/: In: Gerhard Kittel; G. Friedrich, eds. Theological Dictionary of the New Testament, 8. ed. (reprinted) Grand Rapids, Michigan: WM. B. Eerdmans Publishing Co., 1982, v. 1, p. 457-460; H.G. Link; A. Ringwald, Virtude: In: Colin Brown, ed. ger. O Novo Dicionário Internacional de Teologia do Novo Testamento, São Paulo: Vida Nova, 1983, v. 4, p. 574-575; Werner Jaeger, Paidéia: A Formação do Homem Grego, 2. ed. São Paulo: Martins Fontes, 1989, especialmente, p. 19ss.; José Ferrater Mora, Dicionário de Filosofia. São Paulo: Edições Loyola, 2001, v. 4, p. 3027-3028; André Lalande, Vocabulário Técnico e Crítico da Filosofia, São Paulo: Martins Fontes, 1993, p. 1218-1221; F.E. Peters, Termos Filosóficos Gregos: Um léxico histórico, 2. ed. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, (1983), p. 38-39; Jean Porter, Virtudes: In: Jean-Yves Lacoste, dir., Dicionário Crítico de Teologia, São Paulo: Paulinas/Loyola, 2004, p. 1860; Henri-Irénée Marrou, História da Educação na Antiguidade, 5. reimpressão, São Paulo: EPU., 1990, especialmente, p. 28ss.

[6] Thomas Ransom Giles, Filosofia da Educação, p. 64.

[7]Henri-Irénée Marrou, História da Educação na Antiguidade, São Paulo: E.P.U. (5. reimpr), 1990, p. 35.

[8]Henri-Irénée Marrou, História da Educação na Antiguidade, p. 42.

[9]Platão, A República, 7. ed. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, (1993), 376e ss. p. 86ss. Platão preocupa-se com a lendas contadas às crianças pelas amas de leite que difundem o erro por meio de sua “teologia”, já que eram estrangeiras. (Platão, A República, 377a-379a. p. 87-91; Platão, As Leis, Bauru, SP.: EDIPRO, 1999, X, p. 401).

[10]Séculos depois, Plutarco (40-120), refletindo o ensino platônico, a quem considera  “o enviado dos deuses” (Plutarco, Da Educação das Crianças, São Paulo: Edipro, 2015, 5.3d. p. 46), aconselha aos pais quanto à escolha de pedagogo para seus filhos: “É necessário que esse pedagogo seja sério”. Continua: “Devem procurar como professores para seus filhos os que são irrepreensíveis por seu modo de vida, inatacáveis por seus hábitos e os melhores pelas suas experiências. Fonte e raiz da conduta honesta é a educação legítima. Tal como os camponeses colocam estacas nas plantações, assim os professores legítimos fincam oportuno preceitos e conselhos nos jovens, a fim de que deles brotem retos caracteres” (Plutarco, Da Educação das Crianças, São Paulo: Edipro, 2015, 6.4b-c. p. 48).

[11]A palavra “sofista” provém do grego Sofisth/j, que é derivada de Sofo/j (= “sábio”). Originariamente, ambas as palavras eram empregadas com uma conotação positiva. É importante lembrar que foram os próprios sofistas que se designaram assim.

[12] “Já desde o começo a finalidade do movimento educacional comandado pelos sofistas não era a educação do povo, mas a dos chefes. No fundo não era senão uma nova forma da educação dos nobres (…). Os sofistas dirigiam-se antes de mais nada a um escol, e só a ele. Era a eles que acorriam os que desejavam formar-se para a política e tornar-se um dia dirigentes do Estado” (Werner Jaeger, Paidéia: A Formação do Homem Grego, 2. ed. São Paulo: Martins Fontes, 1989, p. 236).

[13] Péricles (499-429 a.C.) deu uma Constituição democrática à Atenas. A vida política e civil da cidade tomou novos aspectos, despertando um novo interesse intelectual. A preocupação com a origem do mundo material, como vimos, que foi característica das épocas anteriores, cede lugar agora, à preocupação com o homem. Neste contexto surgiram os sofistas, eloquentes oradores, retóricos e fundamentalmente pedagogos itinerantes que tinham como meta a educação dos nobres (Cf. Werner Jaeger, Paideia: A Formação do Homem Grego, p. 236).

[14]Cf. Platão, Sofista,  São Paulo: Abril Cultural (Os Pensadores, v. 3), 1972, 222a-223b; 2312c-d. p. 144-146,156; Platão, Teeteto: In: Teeteto e Crátilo, Belém: Universidade Federal do Pará, 1988, 167c-d; Platão, Górgias, Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, S.A., 1989, 317b; Platão, Crátilo: In: Teeteto e Crátilo, Belém: Universidade Federal do Pará, 1988, 384b-c; 391b-c; Platão, Defesa de Sócrates, São Paulo: Abril Cultural, (Os Pensadores, v. 2), 1972, 19d-20a.

[15]Cf. Anthony Kenny, Uma Nova História da Filosofia Ocidental. Volume I – Filosofia Antiga, 2. ed. São Paulo, Loyola, 2011, p. 54-55.

[16]Émile Bréhier, História da Filosofia, São Paulo: Mestre Jou, 1977, 1/1 p. 69-70.

[17]A Retórica Sofística, inventada por Górgias (c.483-c.375 a.C.), era famosa. Górgias dizia:

“A palavra é uma grande dominadora que, com pequeníssimo e sumamente invisível corpo, realiza obras diviníssimas, pois pode fazer cessar o medo e tirar as dores, infundir a alegria e inspirar a piedade (…) O discurso, persuadindo a alma, obriga-a, convencida, a ter fé nas palavras e a consentir nos fatos (…) A persuasão, unida à palavra, impressiona a alma como quer (…) O poder do discurso com respeito à disposição da alma é idêntico ao dos remédios em relação à natureza do corpo. Com efeito, assim como os diferentes remédios expelem do corpo de cada um diferentes humores, e alguns fazem cessar o mal, outros a vida, assim também entre os discursos alguns afligem e outros deleitam, outros espantam, outros excitam até o ardor os seus ouvintes, outros envenenam e fascinam a alma com persuasões malvadas” (Górgias, Elogio de Helena, 8, 14).

“Quanto à sabedoria e ao sábio, eu dou o nome de sábio ao indivíduo capaz de mudar o aspecto das coisas, fazendo ser e parecer bom para esta ou aquela pessoa o que era ou lhe parecia mau” (Palavras de Protágoras, conforme, Platão, Teeteto, 166d).

“Mas deixaremos de lado Tísias e Górgias? Esses descobriram que o provável deve ser mais respeitado que o verdadeiro; chegariam até a provar, pela força da palavra, que as cousas miúdas são grandes e que as grandes são pequenas, que o novo é antigo e que o velho é novo” (Platão, Fedro, 267). Apud Platão, Teeteto: In: Teeteto e Crátilo, Belém: Universidade Federal do Pará, 1988, 152a; 160c.  Citado também em Platão, Crátilo, 385e. Aristóteles (384-322 a.C.), diz: “O princípio (…) expresso por Protágoras, que afirmava ser o homem a medida (Me/tron de todas as coisas (…) outra coisa não é senão que aquilo que parece a cada um também o é certamente. Mas, se isto é verdade, conclui-se que a mesma cousa é e não é ao mesmo tempo e que é boa e má ao mesmo tempo, e, assim, desta maneira, reúne em si todos os opostos, porque amiúde uma cousa parece bela a uns e feia a outros, e deve valer como medida o que parece a cada um” (Aristóteles, Metafísica, XI, 6. 1 062). (Para consultar uma edição bilingue, grego-português, veja-se: Aristóteles, Metafísica, São Paulo: Loyola, 2002.  Platão diferentemente de Protágoras, entendia que a medida de todas as coisas estava em Deus. “Aos nossos olhos a divindade será ‘a medida de todas as coisas’ no mais alto grau” (Platão, As Leis, Bauru, SP.: EDIPRO, 1999, IV, 716c. p. 189).

[18] A retórica mantém estreita relação com os sofistas. Górgias (c. 483-c.375 a.C.), o sofista, disse que o objetivo da retórica é “pela palavra, convencer os juízes no tribunal, os senadores no conselho, os eclesiastas na assembleia e em todo outro ajuntamento onde se congreguem cidadãos” (Platão, Górgias, Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, S.A., 1989, 452e, p. 58-59). Desta forma, a capacidade do retórico era demonstrada na habilidade de “disputar com qualquer pessoa sobre qualquer assunto” e isto se revelava na rapidez com que persuadia as multidões. (Platão, Górgias, 457a, p. 67). A essência da retórica de Górgias era persuadir (Platão, Górgias, 453a, p. 59-60; 455a, p. 64. Platão os denomina de sofistas porque em seus discursos e argumentações procuravam imitar os sábios a fim de persuadir seus ouvintes. (Platão, Sofista,  São Paulo: Abril Cultural (Os Pensadores, v. 3), 1972, 268b-c. p. 203). Nisso, a retórica sofista foi muito bem sucedida. (Veja-se: Armando Plebe, Breve História da Retórica Antiga, São Paulo: EPU; EDUSP., 1978, p. 21ss.).

[19] Vejam-se: Platão, Teeteto, 166c-167d; Sofista, 231d; Mênon, 91c-92b; Fedro, 267; Protágoras, 313c; 312a; Crátilo, 384b; Górgias, 337d; A República, 336b; 338c.

[20]Anthony Kenny, Uma Nova História da Filosofia Ocidental. Volume I – Filosofia Antiga, 2. ed. São Paulo: Loyola, 2011, p. 58.

[21] Aristóteles, Ética a Nicômaco, São Paulo: Abril Cultural, (Os Pensadores, v. 4), 1973, V.2, 1130b 26-27. p. 324.

[22]O hebraico, que era então ainda mais ignorado do que o grego e o latim, foi também redescoberto. Surgindo, então, as famosas escolas que ensinavam os três idiomas – em Lovaina (1517), Oxford (1517 e 1525), Paris (1530) –, visando formar o “homo trilinguis” (Vejam-se: Jacob Burckhardt, A Cultura do Renascimento na Itália: Um Ensaio, São Paulo: Companhia das Letras, 1991, p. 154; Jean Delumeau, A Civilização do Renascimento, Lisboa: Editorial Estampa, 1984, v. 1, p. 97). Posteriormente, a Academia de Genebra fundada por Calvino em 1559, passará a oferecer uma formação trilingue. Os alunos deveriam aprender além do Francês, o Latim e o Grego. (Ford L. Battles, Interpreting John Calvin, Grand Rapids, Michigan: Baker Books, 1996, p. 62).

Foi assim que foi elaborada a primeira gramática hebraica escrita por um cristão, Reuchlin (1455-1522), em 1506. Não devemos nos esquecer também, que é deste período a publicação da “Bíblia Poliglota Complutense” – recebendo este nome por ter sido impressa em Complutum, forma latina da atual Alcalá, Espanha, onde Ximenes fundou uma Universidade –, que continha o Antigo Testamento em 3 idiomas, formatado em três colunas paralelas: Hebraico, latim (da vulgata) e grego (da LXX), tendo, também, uma tradução latina interlinear. Na parte inferior da página, constava do Novo Testamento em grego e latim. Esta obra sendo promovida pelo Cardeal Francisco Ximenes de Cisneros (1437-1517), foi iniciada em 1502 sendo concluída em 1517 (O NT estava concluído desde 1514), sendo constituída por seis volumes. Apenas um detalhe: Ximenes de Cisneros, com amplo respaldo de Fernando e Isabel, foi responsável por um grande despertamento espiritual na Espanha e a moralização do Clero. (Cf.  W. Walker, História da Igreja Cristã, São Paulo, ASTE., 1967, v. 1, p. 399-400).

Façamos uma pequena digressão falando sobre Ximenes.

Ximenes era da ordem dos Franciscanos, conhecido por sua austeridade e ascetismo. A sua influência aumentou quando, em 1495, contra a sua própria vontade, Isabel o fez nomear arcebispo de Toledo, o posto eclesiástico mais influente do seu reino. A sua nomeação veio por ordem direta do Papa Alexandre VI (1492-1503) (Cf. K.S. Latourette, Historia del Cristianismo, 3. ed. Buenos Aires: Casa Bautista de Publicaciones, 1977, v. 1, p. 766).

Ximenes mesmo ocupando este alto posto, continuou a sua vida ascética, dando o melhor de si para o aperfeiçoamento da vida moral e espiritual do clero espanhol, podendo contar para este fim, com o apoio total do papa e de Isabel. Neste seu trabalho, mais de mil monges deixaram a Península para não se submeterem à sua rígida disciplina.  (Cf. Williston Walker, História da Igreja Cristã, v. 1, p. 400. Quanto às suas outras realizações, vejam-se: Williston Walker, História da Igreja Cristã, v. 1, p. 400-401 e K.S. Latourette, Historia del Cristianismo, v. 1, p. 766-767).

O esforço de Ximenes alcançou bons resultados; se caracterizando por um reavivamento da teologia de Aquino e numa manifestação de zelo religioso que brotou no até então árido clero espanhol.

Quanto à da “Bíblia Poliglota Complutense”, o papa Leão X só deu permissão para a sua circulação em 22/03/1520. Ao que parece, esta obra não chegou a Alemanha antes de 1522 e, Lutero não se utilizou dela para a sua tradução do Novo Testamento (Vejam-se mais detalhes em: W.G. Kummel, Introdução ao Novo Testamento, São Paulo: Paulinas, 1982, p. 713-714; Wilson Paroschi, Crítica Textual do Novo Testamento, São Paulo: Vida Nova, 1993, p. 107-108; E. Lohse, Introdução ao Novo Testamento, São Leopoldo, RS.: Sinodal, © 1972, p. 261; Hipólito Escolar, Historia del Libro, 2. ed. corregida y ampliada, Salamanca; Madrid: Fundación Germán Sánchez Ruipérez; Pirámide, 1988, p. 416ss.). Quanto à disposição das três colunas da obra: Hebraico, Latim e Grego, “Cisneros dizia que adotara esta disposição para recordar o lugar que a Igreja romana ocupava entre a sinagoga e a Igreja grega: posição análoga à do Cristo entre os dois ladrões!” (Jean Delumeau, A Civilização do Renascimento, v. 1, p. 98).

[23] Veja-se: Augustus N. Lopes, Ensinar e Aprender em Paulo. In: Fides Reformata, (Edição Especial: Educação) São Paulo: Centro Presbiteriano de Pós-Graduação Andrew Jumper, 13/2 (2008) 113-122, p. 120.

[24] A palavra hebraica (hfnf() (‘ãnãh) tem o sentido de “aflito”, “oprimido”, com o sentimento de impotência, consciente de que o seu resgate depende unicamente da misericórdia de Deus. Esta palavra é contrastada com o orgulho, que se julga poderoso para resolver todos os seus problemas, relegando Deus a uma posição secundária, sendo-lhe indiferente.

hfnf( (‘ãnãh) apresenta também a ideia de ser humilhado por outra pessoa: (Gn 16.6; 34.2; Ex 26.6; Dt 22.24,29; Jz 19.24; 20.5).

[25]A.W. Morton, Educação nos Tempos Bíblicos: In: Merrill C. Tenney, org. ger. Enciclopédia da Bíblia, São Paulo: Cultura Cristã, 2008, v. 2, p. 263.

[26]Rousas J. Rushdoony, A Filosofia do Currículo Cristão,  Brasília, DF.: Monergismo, 2019, p. 34.

[27] Leland Ryken, Santos no Mundo, São José dos Campos, SP.: FIEL, 1992, p. 180.

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